quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Quimera

Ele fitava o fim de tarde como se fosse a última coisa a fazer na vida. O sol se punha vagarosamente. O oeste se ocupava de uma luz límpida e forte, enquanto o leste já tomava seus tons de escuridão. Logo começaria a esfriar, pensou ele. Mais do que isso, o tempo certamente viraria. Era inverno em Teresópolis e o mês de julho passava rapidamente, conforme ele previra. A companhia de sua namorada o deixara muito feliz, desde o momento em que pegara o carro para se dirigir a sua segunda casa, na serra fluminense. Era necessário sair do praxe da cidade para curtir os poucos dias que lhes restavam de ócio.

E como era bela a vista do jardim. A rocha na qual se sentavam era plana o suficiente para que os dois apreciassem a paisagem abraçados. E não havia momento mais propício para admirar a cena, senão o fim de tarde. Não era preciso um diálogo, os dois estavam cientes da sincronia de pensamento. Era ali. O local deles finalmente fora encontrado. O local com o qual sonhavam há quase três meses. Restrito a eles, sem que ninguém os pudesse alcançar. Não era bem assim, mas o amor os fazia crer no improvável e a proximidade do sonho os fazia felizes ou, até mesmo, ingênuos. Agora, sim, os dois se sentiam em casa.

Passados trinta longos minutos de observação, a chuva começa a cair. Nada que os abalasse. Ele a abraçou mais forte para protegê-la dos gélidos pingos d'água. A tempestade se armara. Finalmente, ele disse: "Vamos entrar um pouco, amor". Ela assentiu com a cabeça e os dois caminharam até a simples, porém, valorosa moradia. Lá dentro, ele acendeu a lareira e sentou-se sobre o tapete de lã. Ela, enquanto isso, preparava um chá na pequena cozinha que ladeava a sala. Já se tornara costume, embora o tempo de estadia não ultrapassasse quatro dias, que os dois curtissem a maior parte do tempo juntos, sem que fosse preciso muitas palavras. Isso porque ainda não haviam se dado conta do que estavam vivendo. Era difícil explicar momentos tão intensos.

Com duas xícaras nas mãos, ela reapareceu ao seu lado. Olhou profundamente em seus olhos e beijou-o. E assim permaneceram por longas horas, nem mesmo a forte tempestade que se abatia sobre as janelas de vidro os incomodava. Pelo contrário, consideravam aquele o cenário ideal para essa experiência única. Aquilo tudo era inédito. Iriam para casa na manhã seguinte. A sensação era de terem vivido uma história. Um conto. Uma memória inesquecível. Mais que isso, um...Priiiiiiiii!

Já era manhã. Foi com grande violência que ele desferiu um soco no despertador. Aprontou-se, pegou a mochila e, desolado, partiu. A rotina voltara. Aquilo fora, de fato, um sonho.