Ela admirava
todo aquele movimento com a alegria de uma criança. Evidentemente ela queria
participar. As pessoas lá fora gritavam, se sacudiam, dançavam, valsavam no
insólito baile do caos.
Atrás dela, eu
pouco reparava em tudo o que se sobrepunha a qualquer interesse dela em voltar
a cabeça, ornada por um louro e garboso rabo de cavalo, para trás. Eu só tinha
olhos para a silhueta que tanto admirei, ao vivo, por mais de ano. Era
fascinante. Os impecáveis fios louros, bem penteados e alinhados culminando num
pequeno coque no topo da cabeça.
Meus olhos
desciam e subiam por aquele corpo na mesma velocidade em que as pessoas logo à
frente corriam e se projetavam felizes em direção ao resplandecer da liberdade. A cintura me chamou a atenção. Desta vez, não por um detalhe evidente ou
minimalista. Foi pela ausência. Onde estavam meus braços que em outros tempos
enroscavam-na quando o frio chegava? Ou que a traziam carinhosamente para perto
quando carente? Ou que simplesmente a tocavam num simples gesto de intimidade
natural aos amantes? Isso foi intrigante. Mas o foi só para mim. Ela agora aplaudia
em êxtase o espetáculo de cores e melodias.
Ainda faltava
reparar no sorriso, algo obviamente impossível a quem observa alguém pelas costas. Mas este eu não precisava ver. Resolvi ir embora diante da ignorância da
menina. Coloquei a mão em seu ombro para chamá-la. Ela virou-se e me abriu o tal sorriso. Algo
dentro do peito balançou. Mas eu realmente precisava ir. Beijei-a no rosto e
tomei meu caminho. Não fazia sentido toda aquela desordem. Só ela importava. E
aquele rabo de cavalo. E a cintura. E o sorriso. Mas este eu não precisava ver. Porque naquele momento, ele fora para mim. Mas, é bem verdade, ele não era mais
meu.
O show,
afinal, nem sempre tem que continuar.