Eram 10 da manhã. Ele levantou da cama, pegou seus chinelos, vestiu um casaco e saiu de casa. No jardim, olhou para o céu. O tempo virara. Talvez fosse simbólico. Um clima ameno, uma fina brisa soprava contra seu rosto, um frio leve, uma manhã de despedida. Sentou-se na rede a olhar para o infinito azul do céu. Encolheu-se a fim de se manter aquecido. O calor o fazia lembrar da amada, de seu colo terno e quente. Pela cabeça, passava a retrospectiva dos últimos dias, todos os momentos felizes dos quais jamais esqueceria.
Lembrava do quanto fora engraçado comparar o sotaque do Rio Grande do Sul com o carioca. Lembrava das maravilhosas pessoas que havia conhecido por lá. Lembrava do chimarrão que não lhe agradara muito. Lembrava de como seu amigo se tornara seu fiel companheiro de viagem, e ria-se ao vê-lo dormindo desajeitadamente no sofá. Lembrava da cidade de Nova Petrópolis, aconchegante e acolhedora, tal como a casa em que se hospedava. Lembrava, apesar de ainda estar por lá, pois a saudade já batia forte. Acima de tudo, porém, lembrava-se da guria. A sua razão de estar ali. O motivo de tanto esforço. Aquela que o fazia o homem mais feliz do mundo, em sua modesta e sincera opinião. Os momentos com ela passaram rápido demais, pensava ele. Rápidos como o vento que agora incidia sobre sua face.
De repente, desviando seu olhar vago por não mais que um segundo, ele percebe a presença dela, se aproximando, agasalhada a se proteger do frio, como ele. Levantou de um salto e correu a seu encontro. Beijou-lhe os lábios, apertou-lhe as rosadas bochechas, as quais ele jurava atraírem-no por completo, e abraçou-a. Após certa troca de carinhos, ela o alertou que deveria ir para casa, para ambos se arrumarem para a despedida. Concordando, ele a largou. Dentro de casa, percebera que sua doce hospedeira já acordara, tal como seu sonolento amigo. Recebeu um leve tapa nas costas desse último, como cumprimento. Teria muito a agradecê-lo pela companhia numa longa viagem, mas pensou deixar isso para uma mesa de bar no Rio de Janeiro. Arrumou calmamente suas malas. Percebeu que a carga diminuíra, uma vez que dera presentes a várias pessoas, dentre elas, sua amada gaúcha. Quando acabou, rumou para a cozinha, onde observava com certa melancolia a hospedeira preparar o almoço. Sempre solícita e amorosa, deu-lhe um forte abraço. Sentia-se, agora, um pouco melhor.
Pratos limpos, já era hora de levar as bagagens para o carro. Sua guria já havia voltado. O chofer, outra grande figura, havia acabado de estacionar. Os levaria até a rodoviária. Restava ainda uma hora. Resolveram tomar um café, enquanto papeavam sobre a viagem. A hora passou rápida como o vento da manhã e as altas conversas deram lugar a uma caminhada silenciosa até a rodoviária. O grupo se desmembrou para esperar o ônibus, de modo que sobrassem ele e ela sozinhos. Abraçaram-se por um longo tempo, o suficiente para ser o mais inesquecível abraço que já recebera. Juras de amor e frases feitas não diziam nada, naquele momento. Os olhos nos olhos poupavam as palavras. Seus olhos começaram a marejar. Ela logo os secou, lembrando-lhe da promessa da noite anterior na qual dissera não chorar em sua presença. Ele parou em um profundo soluço e engoliu em seco.
O ônibus chegara. Era hora de terminar aquele sonho, aquele tempo estacionado na realidade dura da vida. Ele a beijou e deu meia volta. Não por falta de educação, mas sim porque não dava mais para segurar. Ele entrou no ônibus e sentou-se, inconsolável. Seu parceiro veio ao lado, dando-lhe um abraço. Ele ainda chorava copiosamente. Minutos de silêncio depois, seu colega disse: “É bonito demais ver vocês dois juntos...”. O garoto levantou a cabeça, secou as lágrimas e sorriu. Finalmente, virando-se ao amigo, falou: “Foram momentos incríveis, meu caro. De fato, não me arrependo de nada. Uma pena ter chegado ao fim. Mas deixa estar. Voltaremos em breve...”.